Breves notas a propósito do Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza
É necessário e possível reduzir a pobreza, combatendo o empobrecimento e as desigualdades
Sonhar não é apenas um acto político necessário, mas uma forma de estar que faz parte da natureza humana. Não há mudança sem sonho, como não há sonho sem esperança, nem esperança sem luta.
Embora acordado, tive um sonho, na passagem de mais um dia 17 de Outubro, Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza. Sonhei que a pobreza tinha sido praticamente erradicada em Portugal. Sonhei que o número de portugueses em risco de pobreza já não era 1,7 milhões, como em 2021, mas um número muito inferior, que, apesar disso, tinham um rendimento adequado para uma vida com dignidade.
Sonhei que eram muito poucas as famílias com privação ou dificuldade de acesso a bens e serviços fundamentais, como a habitação, a saúde, a educação e a cultura, com uma taxa de risco de pobreza ou exclusão social muito inferior aos 19,4% de 2022, que atingia dois milhões de portugueses.
Sonhei que já não havia trabalhadores em risco de pobreza (10,3% em 2021), porque o rendimento monetário líquido do seu agregado familiar já era superior ao limiar de pobreza, com salários mais justos e menos precariedade no emprego.
Sonhei que tinha diminuído significativamente a taxa de pobreza nas famílias com crianças, sobretudo nas famílias monoparentais (28% em 2021) e nas famílias numerosas (22,7% em 2021), porque, para além de mais emprego e melhores salários e do aumento e universalização do abono de família, havia um acesso a serviços e equipamentos de apoio à infância, nomeadamente uma rede pública de creches e de estabelecimentos pré-escolares.
Sonhei que já eram muito poucos os desempregados em risco de pobreza (43,4% em 2021), porque havia melhores condições de acesso, atribuição e montante do subsídio de desemprego.
Sonhei que era reduzido o número de idosos em risco de pobreza (17% em 2021, com maior incidência nas mulheres), porque as pensões e outras prestações do sistema contributivo tinham aumentado para um valor compatível com as necessidades, a par de outras prestações sociais.
Sonhei, qual pesadelo, que quem afirma que 40% dos portugueses são pobres e vivem à custa do Estado, quer distorcer e vilipendiar o sistema público de Segurança Social misturando as pensões de reforma e outras prestações do sistema previdencial, substitutivas de rendimentos de trabalho perdido (contributivo), com apoios sociais do sistema de proteção social de cidadania (financiado pelo Orçamento de Estado).
Sonhei que as ações pontuais de emergência social ou de assistência são importantes, mas apenas mitigam situações de privação que são, em grande parte, consequências da pobreza, mas não conduzem à sua erradicação.
Sonhei que havia uma efetiva Estratégia Nacional de Combate à Pobreza com medidas estruturais focadas nas causas da pobreza e da exclusão social, assentes numa justa repartição primária dos rendimentos, com aumento do peso dos rendimentos do trabalho (salários, pensões e outras prestações do sistema previdencial), o aumento significativo das prestações sociais, como o abono de família, o complemento para idosos e o rendimento social de inserção.
Sonhei que havia um governo que tinha olhado para o combate à pobreza com a dignidade que merece e, por isso, tinha colocado a erradicação da pobreza como um desígnio nacional, agindo através da articulação de diversas políticas públicas, de forma integrada e multidimensional.
Sonhei que a pobreza não é uma fatalidade e que é necessário e possível reduzir fortemente a pobreza, combatendo o empobrecimento e as desigualdades sociais e melhorando as condições de vida da população.
Sonhei que todos os portugueses tinham um rendimento adequado, uma habitação condigna e acesso a serviços públicos de qualidade, fundamentais para uma vida justa e digna.
Sonhemos! O sonho é também acção.
Porque o sonho comanda a vida, sonhemos e, com determinação e luta, transformemos o sonho em vida.
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