segunda-feira, 4 de agosto de 2014

O que perdem os utentes com os “Espaços e Lojas do Cidadão”

 
O que perdem os utentes com os “Espaços e Lojas do Cidadão”
POR TRÁS DAS ANUNCIADAS VANTAGENS, É MAIS UM PROJECTO PARA A RESTRIÇÃO/REDUÇÃO EFECTIVA AO DIREITO À INFORMAÇÃO E À RECLAMAÇÃO por parte dos utentes sobre os seus direitos.
O projecto apresentado na primeira reunião do Conselho de Concertação Social” (realizada a 28 de Abril), teve desenvolvimento com a aprovação pelo Conselho de Ministros do DL 74/2014 de 13 de Maio que institui a chamada «Rede de espaços de cidadão».
Os últimos Governos têm-se caracterizado pela ofensiva contra os Serviços Públicos – criados no esteio da Revolução de Abril de 1974 e inscritos na Constituição da República que dela emanou –, a maioria de iniciativa popular, consignados posteriormente na forma de lei.
A par da sucessiva redução dos orçamentos, da dificuldade ou mesmo impedimento da contratação de novos funcionários e da precipitação da passagem à aposentação de muitos dos mais experientes e qualificados, do encerramento de repartições, secções, balcões e outros serviços de atendimento local, prossegue este Governo a ofensiva com a chamada municipalização de serviços, enroupados com palavras de veludo, pelos criativos de serviço, como «Administração de proximidade», «mediação da cidadania» prometendo mais e melhores serviços – insinuando hipocritamente que tudo o que destroem é para benefício dos utentes.
Actualmente estão na mira do Governo a municipalização e/ou privatização, entre outros, do atendimento aos utentes com criação dos “Espaços e Lojas do Cidadão”. O Governo encerra ou reduz a prestação de serviços em: balcões de Segurança Social, Repartições de Finanças, Tribunais Públicos, distribuição postal – vulgo CTT –, Cartórios e Registos, delegações locais dos ministérios, e vem agora passar o ónus da prestação desses serviços, em especial para as autarquias como se estas tivessem possibilidade de resolver alguns dos mais delicados problemas criados pelo ataque aos rendimentos e direitos sociais dos utentes.
Na mesma linha surge o chamado projecto «Portugal porta-a-porta» – mais uma vez baseado, com um vocabulário demagógico, apostando na tese da equidade de oportunidades dos cidadãos, na coesão económica, social e territorial destinado a transferir para as autarquias locais a responsabilidade de uma rede de mobilidade que assegure as necessidades de transporte que o encerramento de muitos serviços cria às populações.
Mas o que são estes Espaços do cidadão: - São designados “espaços do cidadão” os resultantes de protocolos entre a Agência para a Modernização Administrativa (AMA-IP) com autarquias, IPSS, fundações, associações nomeadamente empresariais ou outras de direito privado que prestam serviços públicos e as “lojas do cidadão cujo propósito é da “concentração dos espaços de atendimento dos serviços e organismos do Estado”, lojas estas que devem incluir no seu seio um “espaço do cidadão” justificado para “possibilitar o atendimento digital assistido de outros serviços públicos que não hajam sido objecto dessa concentração”.
A associação das autarquias locais a esta estratégia coloca – para lá de questões políticas de princípio – outros e relevantes problemas:
1.º - De natureza política local, dado que a assunção de um espaço que, para todos os efeitos será visto como municipal, transferirá para a autarquia todas a insatisfações associadas ao seu funcionamento: seja as que resultem da insuficiência de resposta (passa a ser um balcão de atendimento e não serviços dedicados a solicitações específicas; seja, sobretudo, as inúmeras insatisfações decorrentes dos cortes nas prestações sociais, das situações de desemprego, etc);
2.º - De expressão financeira, naquilo que constituirá um novo e pesado encargo, libertando a administração central dessa responsabilidade e transferindo para as autarquias o essencial da despesa. Registe-se que os protocolos prevêem que sejam as autarquias locais a suportar os custos com as instalações e as necessárias obras de adaptação destinadas a acolher o serviço; o pessoal indispensável para a chamada mediação de atendimento digital; consumíveis e material de economato; fornecimento de água, electricidade, gás e comunicações; segurança e limpeza dos locais; manutenção dos equipamentos instalados! À AMA-IP restará a responsabilidade de “realizar inspecções”, “ emitir recomendações” aprovar os procedimentos”. Mesmo a responsabilidade de formação do pessoal, cometida à Agência, tem ressalvado que havendo despesas de transportes para os formandos estas serão da autarquia.
Sendo certo que o funcionamento das «Lojas do Cidadão» onde existiram, sendo espaços da responsabilidade partilhada dos ministérios e sob a alçada do Estado, tiveram aspectos positivos no atendimento que importava aprofundar, qualificar, melhorar e por isso disseminar. Mas o ministro Poiares Maduro, na Assembleia da República, declarou que o modelo das Lojas do Cidadão está obsoleto, defendendo o novo modelo desresponsabilizando a Administração Central do atendimento público na maioria do território nacional.
Aqui chegados, o que perdem os utentes com mais esta iniciativa governamental?
-        Desde logo a garantia da confidencialidade e privacidade dos dados pessoais;
-        O atendimento qualificado em cada matéria que tenha de tratar com a Administração Central;
-        A garantia do princípio da não discriminação no atendimento, pois este novo modelo implicará haver centros urbanos onde os utentes poderão continuar a recorrer aos serviços qualificados dos ministérios, e outras localidades onde tal deixa de ser possível;
-        No caso das autarquias que prestarem este serviço:
·         Dado que as autarquias estão impedidas de contratar novos funcionários, terão de desviar funcionários de outros serviços, prejudicando-os, ou encomendar o serviço a empresas de colocação de pessoal de trabalho temporário;
·         Arcam com todas as despesas de funcionamento e formação;
·         Em todos os casos desviando verbas dos seus já parcos orçamentos, prejudicando projectos do interesse dos munícipes, também utentes;
-        No caso de o atendimento ser entregue a outras entidades, nomeadamente os ainda existentes postos dos CTT, agora empresa privada:
·         Transferência de dinheiros públicos para empresas privadas sem melhoria da qualidade do serviço prestado;
·         Disseminação do acesso às bases de dados pessoais;
·         Aumento da probabilidade do tráfico destes dados;
·         Possibilidade de conflito de interesses entre o utente e a entidade privada encarregue do atendimento;
·         Redução da quantidade e qualidade dos serviços prestados por estas entidades;
E indirectamente:
·         Aumento do trabalho precário e mesmo do desemprego com todas as suas consequências de degradação social.
A complexidade técnica dos assuntos a tratar vai esbarrar nos problemas da oferta informática, na morosidade do atendimento e na provável impreparação dos trabalhadores que vão ficar nos serviços concentrados em espaços físicos desadequados. A generalidade dos utentes dos serviços públicos, principalmente os que residem em zonas menos povoadas, vai ficar claramente a perder em qualidade e proximidade. 
Por tudo isto consideramos que esta iniciativa governamental tem mais aspectos negativos do que positivos para os utentes.
 
Distrito de Santarém, 3 de Agosto de 2014



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