OE 2015: saúde penalizada com mais austeridade
Publicado em 15 de Outubro de 2014, por Catarina Gomes
De acordo com a versão preliminar do Orçamento Geral do Estado (OE) para 2015, a que o nosso jornal teve acesso, os médicos integrados em unidades do Serviço Nacional de Saúde (SNS) poderão ser requisitados pelas administrações regionais de saúde (ARS) para prestarem serviço noutras unidade onde se verifique carência de médicos, ao abrigo do regime de mobilidade dos profissionais de saúde já em vigor. “Em situações de manifesta carência, susceptíveis de poderem comprometer a regular prestação de cuidados de saúde, podem as Administrações Regionais de Saúde utilizar a mobilidade prevista [na Lei] de um trabalhador de e para órgão ou serviço distintos, desde que, ambos, situados na respectiva área geográfica de influência”, lê-se na versão preliminar do OE/15.
Taxas moderadoras afinal vão aumentar
Ao contrário do que tinha vindo a ser sugerido por diversos altos responsáveis da saúde nos últimos tempos, incluindo o ministro, Paulo Macedo, as taxas moderadoras na saúde não vão descer o preço no próximo ano. Pelo contrário, deverão mesmo sofrer um aumento ligeiro, indexado ao valor da inflação. Isto porque de acordo com a versão preliminar conhecida do OE/2015 mantém-se a regra de actualização do valor das taxas à inflação, à excepção das taxas pagas nos cuidados de saúde primários. Uma excepção que, aliás, já aconteceu em 2013 e 2014.
Recorde-se que no passado dia 3, durante o debate parlamentar subordinado ao tema “SNS, erros do passado e desafios do futuro”, Paulo Macedo admitiu baixar as taxas moderadoras em 2015. Uma diminuição que segundo o ministro seria sempre pequena, ao nível dos cêntimos, mas que ainda assim poderiam fazer recuar os valores aos níveis de 2013. “Às perspectivas da inflação nós entendemos que há uma possibilidade concreta de reduzir as taxas moderadoras”, concretizou o ministro.
Centros de saúde geridos pelas autarquias?
Não é perfeitamente claro na redacção da versão preliminar no OE/2015 a que o nosso jornal teve acesso, que o Governo vá mesmo iniciar no próximo ano a transferência da gestão dos centros de saúde do continente para a esfera municipal.
A possibilidade de tal poder vir a acontecer surge da previsão, inscrita no documento, de que em 2015 fica o Governo “autorizado a transferir para os municípios do continente as dotações inscritas no orçamento do Ministério da Saúde, referentes à competência a descentralizar no domínio dos cuidados de saúde primários”.
As verbas concretas a transferir serão definidas posteriormente, “mediante portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças, da saúde e da administração local”.
Recorde-se que em meados de Julho, o ministro-adjunto e do Desenvolvimento Regional, Miguel Poiares Maduro, anunciou que o Governo estava a estudar a transferência da gestão dos centros de saúde para os municípios, no âmbito da descentralização de competências que abrange também as escolas e a segurança social. De acordo com Poiares Maduro, o modelo de descentralização dos centros de saúde para as autarquias envolve também o Ministério da Saúde e deve ser um modelo que defina “com muita clareza quais são as competências da administração central e dos municípios e quais os meios financeiros a que está sujeita a transferência das competências”.
Ora, a verdade é que não obstante o anúncio e mesmo a previsão inscrita na versão preliminar do OE para 2015, não existe qualquer grupo de trabalho, plano ou roteiro que possibilite determinar com um mínimo de certeza o que de facto se pretende.
Endividamento: hospitais EPE com “rédea curta”
Em 2015, os limites ao endividamento das empresas do sector público – entre as quais se destacam, pelo incumprimento reiterado, os hospitais EPE – desce um ponto percentual relativamente ao tecto aplicado este ano, que foi de 4%, considerando o financiamento remunerado corrigido pelo capital social realizado.
Mercado farmacêutico vai ser taxado
Prevista para entrar em vigor já no OE de 2014, a taxa sobre as vendas da indústria farmacêutica acabaria por ficar “na gaveta” tendo o efeito previsto sido substituído pelo resultante do acordo celebrado entre o Ministério da Saúde e a Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica (APIFARMA), celebrado em Junho, através do qual as empresas do sector se comprometem na redução da despesa pública com medicamentos com uma contribuição de 160 milhões de euros.
Mas vai mesmo avançar em 2015, de acordo com a proposta de orçamento para o ano que vem, onde se pode ler que a nova taxa incidirá sobre todas as entidades que façam a primeira venda em território nacional de medicamentos e irá incidir sobre o total das vendas mensais de medicamentos comparticipados pelo Estado, sujeitos a receita médica, gases medicinais e derivados do sangue e plasma humanos, medicamentos órfãos ou para consumo em meio hospitalar.
A também chamada “taxa de sustentabilidade” será aplicada sobre o valor remanescente do Preço de Venda ao Público, após dedução da taxa de IVA e do valor correspondente à comparticipação pelo Estado.
As taxas da contribuição vão ser definidas por portaria do ministro da Saúde, e podem variar entre os 0,5% e os 12% nos medicamentos comparticipados, 10% a 15% nos medicamentos sujeitos a receita médica, 0,5% a 5% em gases medicinais e derivados do sangue e do plasma e em igual montante nos medicamentos órfãos.
As taxas a aplicar serão fixadas em portaria a publicar oportunamente, ainda que a aplicação entre em vigor já em Janeiro, com valores entre os 2,5% e 12,4%.
Do valor resultante da cobrança das novas taxas sobre as vendas de medicamentos e produtos de saúde, 97% será afecto ao SNS, como receita própria, revertendo os 3% remanescentes a favor da Autoridade Tributária e Aduaneira, para cobrir “encargos com liquidação e cobrança”.
Outra novidade prevista na proposta de OE para 2015 é a aplicação de juros de mora às empresas farmacêuticas que não liquidem as taxas dentro do prazo respectivo. “Começam a correr imediatamente juros de mora”, lê-se na versão preliminar do OE/15 e a “cobrança da dívida é promovida pela Autoridade Tributária e Aduaneira”.
As medidas de controlo da despesa com medicamentos, cujo aumento é, de acordo com os especialistas, inevitável, devido à evolução do perfil epidemiológico nacional levou o executivo de Passos Coelho a avançar com medidas suplementares que permitam atenuar a tendência. Uma delas é a que determina que “o Preço de Venda ao Armazenista (PVA) máximo não pode ultrapassar o PVA médio praticado nas aquisições pelos hospitais do SNS no ano civil anterior [2014]“, lê-se na versão preliminar do documento.
Cigarros electrónicos vão ser tributados
De acordo com a versão preliminar do OE para 2015, os cigarros electrónicos vão passar a ser tributados. O imposto sobre o tabaco passará a incidir no líquido contendo nicotina, em recipientes utilizados para carga e recarga de cigarros electrónicos. “São equiparados aos cigarros, aos tabacos de fumar, ao tabaco para cachimbo de água, ao rapé, ao tabaco de mascar e ao tabaco aquecido, os produtos constituídos, total ou parcialmente, por substâncias que, não sendo tabaco, obedeçam aos outros critérios” como o “tabaco manufacturado especialmente preparado para emitir um vapor sem combustão da mistura de tabaco nele contida”, lê-se no documento. Excluídos da tributação ficam os produtos que tenham uma função exclusivamente medicinal.
Venda ou aluguer de imóveis para reforçar capital dos hospitais EPE
Na proposta de OE para o próximo ano, prevê-se que o Ministério da Saúde possa utilizar total ou parcialmente o produto da alienação, oneração, arrendamento e cedência de utilização de imóveis. O que poderá servir para reforço de capital dos hospitais EPE, construção ou manutenção de infra-estruturas afectas a cuidados de saúde primários e para despesas necessárias à aquisição de equipamentos de diagnóstico e de terapia, bem como despesas necessárias aos investimentos destinados à recuperação e manutenção de edifícios e reorganização das infra-estruturas do Parque de Saúde de Lisboa.
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