Portugal demorou mais três horas do que Espanha para reiniciar energia
Primeira central portuguesa com mecanismo black-start demorou quase quatro horas a arrancar, com a segunda a demorar quase cinco horas, depois de “tentativas prévias sem sucesso”. Centrais espanholas com arranque autónomo arrancaram no espaço de uma hora depois do apagão de 28 de abril.
Portugal demorou o quádruplo do tempo face Espanha a arrancar com o mecanismo de reinício do sistema elétrico (conhecido por black-start) após o apagão ibérico no dia 28 de abril.
A conclusão é do relatório preliminar da associação europeia que junta as empresas gestoras da rede de transporte de eletricidade (ENTSO-E) que vai ficar responsável pela investigação pelo pior apagão das últimas décadas em Portugal e Espanha.
Neste momento, é consensual em Madrid e Lisboa que o arranque do apagão partiu de Espanha, mas o relatório preliminar da ENTSO-E lança mais pistas sobre o apagão e a resposta a este evento fatídico a 28 de abril em que as economias dos países ibéricos travaram a fundo.
Se Espanha conseguiu arrancar com as suas centrais em black-start uma hora depois do apagão, Portugal demorou quase quatro horas para arrancar com a primeiro central e quase cinco horas para arrancar com a segunda central. Face ao arranque de Espanha, foram quase 3 horas para a primeira central e quase quatro horas para a segunda central.
Depois do apagão pelas 11h33, hora de Lisboa, somente pelas 15h11 e 16h26 é que “as duas centrais com capacidade black start em Portugal tiveram sucesso no seu processo de arranque após tentativas prévias sem sucesso, permitindo iniciar a restauração do processo em Portugal com duas ilhas”, segundo a ENTSO-E.
Já em Espanha, “do início da restauração até às 13h30 CET [12h30 em Lisboa], várias centrais hídricas em Espanha com capacidade black-start lançaram os seus processos para iniciar a restauração do sistema”, isto é, uma hora depois do apagão pelas 11h33.
O apagão ibérico já foi classificado como “ICS 3 – Blackout”, o nível mais grave da escala internacional de incidentes” pela ENTSO-E, sendo o pior no velho continente desde 2006.
As duas centrais em black-start pertencem à EDP, a central de Castelo do Bode, e à Turbogás dona da central a gás da Tapada do Outeiro. O JE pediu um comentário às duas empresas, com a Turbogás a rejeitar responder “neste momento”.
Já a EDP respondeu: “Em estreita coordenação com a REN, a EDP procedeu, com sucesso, à reativação da central de Castelo do Bode”, apontando que Espanha teve a ajuda das interligações internacionais para arrancar com o processo de reativação da rede, enquanto que a sua foi a “primeira” central ibérica a ser reativada, sem ter o auxilio de uma interligação.
“As tentativas de arranque estão dentro dos padrões de normalidade destes processos. Além da equipa técnica de base que assegura o normal funcionamento da operação de Castelo do Bode, foram igualmente acionadas equipas adicionais que, em minutos, se apresentaram no local. Juntas, conseguiram, fruto do elevado conhecimento técnico e fortíssimo empenho, contribuir de forma decisiva para a reposição de energia no país”, segundo fonte oficial do grupo EDP.
Durante o arranque, a central de Castelo de Bode não conseguiu ativar localmente o sistema e teve de recorrer a um gerador externo para a reativação, conforme revelou o “Expresso”.
No outro lado da raia, as barragens de La Muela e de Aldeadávila recorreram à bombagem e foram chave para o processo de arranque, passando de zero a 3 gigawatts em minutos. Formaram uma ‘ilha’ energética com uma frequência de 50 Hz antes de introduzir carga no sistema. As turbinas foram sendo ligadas uma a uma, sendo introduzida carga de forma doseada para o sistema não voltar a parar, explica o portal espanhol “Xataka”, um sistema semelhante ao que foi usado em Portugal. Depois, arrancaram as centrais de gás espanholas, antes de as renováveis voltarem. Marrocos deu uma ajuda ao injetar centenas de megawatts que foram cruciais para arrancar com centrais na Andaluzia e França também ajudou no norte do país ao arranque.
Em Portugal, os contratos anuais para as centrais de arranque autónomo têm custos diferentes. A central de Castelo de Bode custa 240 mil euros por ano, com a central da Tapada do Outeiro a custar 8.200 euros por arranque, mais o gás consumido a preço de custo, segundo a ERSE.
O Governo português anunciou a 29 de abril que quer mais duas centrais com mecanismo black-start para reiniciar mais rapidamente o sistema elétrico depois de um apagão: as barragens do Baixo Sabor, detida pelos franceses da Movhera, e a do Alqueva, detida pela EDP.
O administrador da REN João Conceição veio a público dizer que a recuperação da rede elétrica depois do apagão teria sido mais rápida com mais centrais com mecanismo black-start.
“Se tivéssemos mais centrais teríamos uma recuperação iniciada em diferentes pontos do país. Ter mais centrais em black-start permitiria criar ilhas em redor dessas centrais”, afirmou o responsável em entrevista à “RTP” a 29 de abril. “Tivemos a Tapada do Outeiro para o norte, Castelo do Bode para o sul. O Alqueva permitiria criar uma terceira ilha, e o Baixo Sabor uma quarta ilha”.
No seu relatório, a ENTSO-E destaca que houve “dois períodos de oscilações (mudanças de frequência e potência)” registadas meia-hora antes do apagão, com os operadores de rede de Espanha e França (Red Electrica e RTE) a “tomarem medidas para mitigar as oscilações. No momento do incidente, não existem oscilações” e as variações no sistema elétrico estavam dentro dos parâmetros normais. ... (in JE)
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