segunda-feira, 29 de maio de 2023

OPINIÃO: Transição digital e realidade

Transição digital e realidade

Vasco Cardoso

Os ser­viços de te­le­fone, In­ternet e te­le­visão trans­for­maram-se numa ne­ces­si­dade bá­sica para as po­pu­la­ções. Do seu acesso de­pendem não apenas as­pectos re­la­ci­o­nados com co­mu­ni­ca­ções e en­tre­te­ni­mento, mas cada vez mais im­por­tantes di­men­sões da vida pes­soal, es­colar e pro­fis­si­onal. Uma al­te­ração que re­quereu, e está a re­querer, vo­lu­mosos in­ves­ti­mentos, no fun­da­mental ga­ran­tidos pelo erário pú­blico (or­ça­mentos do Es­tado, fundos co­mu­ni­tá­rios, PRR, etc.), apesar das re­ceitas anuais deste sector atin­girem em Por­tugal va­lores pró­ximos dos quatro mil mi­lhões de euros. Dito de outra forma, o in­ves­ti­mento é pú­blico, as re­ceitas são pri­vadas.

Tal como nou­tras di­men­sões da vida do País, também aqui se pro­cedeu à pri­va­ti­zação de im­por­tantes em­presas pú­blicas – a PT e os CTT, sobra a RTP – e à li­be­ra­li­zação, sempre em nome de me­lhores ser­viços e da re­dução dos preços e na es­teira das im­po­si­ções da UE que, também aqui (podia ser na banca, na energia ou na avi­ação), con­correm para uma cada vez maior con­cen­tração de ca­pital.

Este per­curso fez de Por­tugal um dos países na Eu­ropa onde as te­le­co­mu­ni­ca­ções são mais caras e onde o preço mais tem au­men­tado (5,7% só no úl­timo mês de Março). Quanto à qua­li­dade do ser­viço, as­sis­timos a enormes atrasos na li­gação de todas as zonas do País à rede de banda larga fixa, a atrasos na im­ple­men­tação do ser­viço 5G (in­se­pa­rá­veis das re­gras im­postas pela UE), ao con­di­ci­o­na­mento da Te­le­visão Di­gital Ter­restre – TDT (nú­mero de ca­nais dis­po­ní­veis, co­ber­tura ter­ri­to­rial..), si­tu­ação par­ti­cu­lar­mente es­can­da­losa porque dela be­ne­fi­ciam os ca­nais pri­vados de TV e as ope­ra­dores de te­le­co­mu­ni­ca­ções. No fundo, as po­pu­la­ções são em­pur­radas para o ser­viço pago – par­ti­cu­lar­mente as que têm cri­anças, se­gundo es­tudos re­centes – em vez do acesso a um ser­viço gra­tuito de qua­li­dade.

Os su­ces­sivos go­vernos es­condem-se por trás da in­ter­venção do cha­mado re­gu­lador – ANACOM – cujo papel, sem pre­juízo de de­nún­cias feitas, se li­mita a va­lidar a ac­tu­ação dos grupos mo­no­po­listas.

Dizem-nos que es­tamos na era da tran­sição di­gital. Mas este salto tec­no­ló­gico tem de ser co­lo­cado ao ser­viço do povo por­tu­guês, em vez de estar a ser cap­tu­rado pela ga­nância dos grupos eco­nó­micos e das mul­ti­na­ci­o­nais. 

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