sexta-feira, 30 de março de 2012

Médicos alertam para degradação das condições do Hospital de Santarém


Médicos alertam para degradação das condições do Hospital de Santarém
“Entendemos que esta informação deve chegar à população, para ter conhecimento devidamente informado da razão da degradação das situações assistenciais, fundamentadas do ponto de vista técnico, pelos médicos que tudo fizeram para o evitar e não foram ouvidos”, dizem os 11 médicos especialistas de Medicina Interna do Hospital de Santarém, em carta aberta ao conselho de administração.

Esta carta aberta foi subscrita em unanimidade pela totalidade dos onze médicos internistas (especialistas de Medicina Interna) do Hospital Distrital de Santarém. Os médicos internistas são responsáveis pela assistência aos doentes na urgência, nas enfermarias de Medicina Interna, nas consultas e nos hospitais de dia; prestam também apoio aos doentes internados nas enfermarias das outras especialidades e são responsáveis pela formação de outros médicos. “Cremos que compreenderão a amplitude da nossa atuação e as consequências para o utente da degradação das nossas condições de trabalho: Neste momento e por razões externas à nossa vontade, esta degradação coloca em risco o funcionamento, em condições tecnicamente mínimas, da urgência e do internamento. Sem os médicos internistas o serviço de urgência não funciona e não há apoio médico nas enfermarias.”, referem os médicos no documento a que O Ribatejo teve acesso. Foi dado conhecimento deste documento à Ordem dos Médicos e aos sindicatos médicos.

Os médicos internistas do Hospital de Santarém dos Serviços de Medicina 3 e 4 alertam para as condições de trabalho a que actualmente estão sujeitos.

Referem que “têm vindo a assistir a uma redução continuada no número de especialistas, com um progressivo incremento das solicitações diárias assistenciais”.

Os recursos humanos na Medicina Interna, manifestamente insuficientes face às necessidades actuais, de acordo com a tipologia do Hospital de Santarém, são as seguintes:

Dezassete assistentes de Medicina Interna, dos quais 1 é um assistente graduado sénior aposentado (Direcção do Departamento Médico), 3 têm funções directivas (Direcção dos Serviços de Medicina 3, 4 e Urgência), 2 prestam trabalho exclusivamente na UCI e 1 um no Serviço de Urgência.

Restam apenas 11 internistas para a actividade diária nas Enfermarias de Medicina. Acresce que 5 têm mais de 50 anos, dois têm mais de 55 anos e só 4 têm menos de 50 anos.

O proposto para o Hospital de Santarém EPE, pelo normativo da ACSS – Autoridade Central do Sistema de Saúde de 2011, é idealmente de 46 internistas, com um mínimo de 35.

A taxa de ocupação em todo o ano de 2011 foi muito superior aos 100% da capacidade instalada nos serviços de Medicina e nos meses de Janeiro e Fevereiro de 2012 foi de 172% na Medicina 3 e 161% na Medicina

De acordo com o número de internistas existentes, corresponde a uma média muitíssimo elevada de doentes por assistente de Medicina Interna.

A solução encontrada até agora tem passado sempre pelo aumento do número de doentes atribuídos à Medicina Interna, com cedência de camas de outras especialidades, tendo culminado com a recente ocupação das camas do piso 10, cabendo de novo aos médicos internistas a assistência àqueles doentes.

Apesar de existirem apenas 11 internistas com actividade assistencial na enfermaria, estes foram confrontados com o recente aumento da lotação dos Serviços de Medicina, tendo o Serviço de Medicina 3 passado da lotação de 31 camas para 47 e o Serviço de Medicina 4 de 62 para 84 camas.

“Acresce que não nos é feito nenhum pagamento extra por este esforço assistencial, ao contrário de outras especialidades e do que está a ser efectuado aos enfermeiros e auxiliares que prestam serviço no piso 10.

Assim, perante o número de assistentes de Medicina Interna cada vez mais reduzido é-lhes solicitada cada vez mais actividade, assegurando ainda a Consulta interna de apoio a outras especialidades no internamento, a prestação de informação a familiares, atividade formativa e a Consulta externa de medicina e de subespecialidade.

Nas equipas de Urgência da área médica tem-se assistido igualmente à redução do número de internistas, existindo com frequência apenas um especialista de Medicina Interna no período nocturno contrariamente às recomendações da Ordem dos Médicos. A restante equipa é cada vez menos diferenciada, constituída frequentemente por internos de diferentes especialidades e/ou médicos sem especialidade hospitalar.

“De acordo com a constituição das equipas de urgência actuais na área médica, perante o número manifestamente escasso de médicos diferenciados e o elevado número de utentes assistidos, é muito difícil assegurar qualidade na prestação dos cuidados urgentes aos utentes. De igual modo a função de “responsável da equipa médica” atribuída a um internista do hospital (frequentemente único no período nocturno) está também comprometida”, refere a carta.

“De salientar que esta redução não se verifica em outras áreas do serviço de Urgência, nomeadamente nas especialidades de Ortopedia, Cirurgia, Ginecologia e Pediatria”, sublinham os médicos.

De acordo com o número acrescido de doentes internados na dependência da área médica, são múltiplas as chamadas urgentes aos serviços de internamento (Urgência Interna) nos períodos da tarde e noite, de 2ª a 6ª feira e nas 24 horas dos fins-de-semana e feriados, as quais estão também a cargo da equipa de urgência médica. “Tal sobrecarga vem ainda agravar o já difícil desempenho na urgência externa. Afigura-se urgente o reforço da equipa com um elemento cuja actividade seja exclusivamemente a Urgência Interna”, propõem os médicos.

De acordo com a Lei em vigor, num hospital que serve uma população de 191 mil habitantes, com o actual número de episódios de urgência, com 400 camas deve ter 46 internistas, como já referido.” Dado que as 10 horas actuais previstas no horário de cada assistente são manifestamente insuficientes, devia ser concedido horário em regime de jornada contínua”, sublinham os médicos.

“Pese embora a manifesta ausência de condições para o exercício das suas funções”, os médicos internistas signatários referem na carta aberta que “continuarão a exercer as suas funções e a prestar a sua actividade clínica pelo que o continuarão a fazer com o máximo zelo e diligência como é, aliás, seu timbre”. Porém, advertem que “não se poderão responsabilizar por quaisquer actos ou omissões decorrentes da aludida ausência de condições, particularmente decorrentes da aludida carência de profissionais médicos de que padece o serviço”. Os médicos solicitam ao conselho de administração do Hospital que “sejam adotadas as diligências adequadas a suprir tais carências sem o que, inevitavelmente, será posta em causa a qualidade da prestação de cuidados médicos, bem como a celeridade e prontidão da mesma”.
(in O Ribatejo)

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