Intervenção do MUSP no Fórum Liberdade
e Pensamento Critico Lisboa, Liceu Camões, 15 de Julho
de 2023
Amigas e amigos a todos cumprimentamos:
Começo por
agradecer em nome do MUSP a oportunidade de intervir no tema dedicado ao Serviço Nacional de Saúde, um
serviço público decisivo para a nossa qualidade de vida.
A interligação dos Serviços Públicos
com o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e a importância da sua defesa neste
contexto
O MUSP, como
Movimento de Defesa dos Serviços Públicos, nesta sua intervenção não pode
deixar de realçar a importância e necessária articulação do SNS no conjunto dos
restantes Serviços Públicos.
Neste sentido
salientamos a importância da Segurança Social Pública e Universal, dos
Transportes, da Protecção Civil e Corpos de Bombeiros, das Telecomunicações e
Correios, da Escola Pública, para referir só os mais óbvios e correntes para a
concretização da meritória missão do SNS.
O SNS é o serviço público
da maior importância e valor para a população portuguesa.
Se, para além da
sua intervenção no nosso quotidiano colectivo, outro argumento fosse necessário para o comprovar, tal ficou evidente
no combate à recente Pandemia, revelando à saciedade a sua
valia, centralidade e importância para Portugal, e o valor, dedicação e
excelência dos seus profissionais, os quais daqui de novo saudamos.
Fomos assistindo
com preocupação anos consecutivos às vagas nos cursos para a especialidade
médica de Saúde Pública ficarem desertas, e algumas das preenchidas serem
somente um “trampolim” para acesso a outras especialidades médicas mais
apelativas, ou mesmo ao assalto por parte do negócio privado da saúde, deixando
os municípios e as suas comunidades, desguarnecidos desta importante
especialidade médica.
Embora a missão
da Saúde Pública não incida em utentes individuais, mas sim nas comunidades,
têm uma função muito importante no estudo e acompanhamento das patologias mais
incidentes sobre as Comunidades onde exercem; detectando as prevalentes, e
levando, das formas permitidas pela lei, as autoridades competentes a adoptarem
medidas correctivas, no plano alimentar, no exercício físico, na eliminação
de focos de
contágio, etc., etc., de modo a diminuir as suas incidências, a melhorar o
nível de saúde das comunidades actuando preventivamente, e diminuindo as
despesas e o sofrimento devidos às doenças: talvez por isso um desinvestimento
tão grande nas carreiras desta especialidade médica, pois, actuando
preventivamente, prejudica o negócio da Doença.
Privando
comunidades como a Escolar e a Geriátrica, cujas, tendo patologias tipificadas e outras emergentes, carecem
de um acompanhamento mais próximo e incisivo,
tendo um acompanhamento insuficiente pioram os seus indicadores da saúde, aumenta o
sofrimento dos cidadãos e os custos para os próprios e para o SNS.
Mas também a
Medicina do e no Trabalho, onde ocorrem danos físicos para toda a vida, podendo
ser evitados e, ou prevenidos com um acompanhamento próximo e atempado das
Unidades de Saúde Pública assumindo a função inspectiva e correctiva.
O Poder Local Democrático é um importante pilar da nossa vida colectiva.
A partir do 25
de Abril de 1974 o Poder Local passou a ter uma forte participação dos cidadãos na gestão da coisa pública
através dos seus eleitos, membros
dessas mesmas comunidades,
sujeitos a escrutínio diário e a uma partilha de preocupações com os seus
eleitores e concidadãos; e, com a publicação da CRP em Abril de 1976, foi o
embrião da organização democrática do Estado compreendendo a existência de
Autarquias Locais como pessoas colectivas territoriais visando a prossecução de
interesses próprios das populações.
Graças a esta
importante Conquista da Revolução de Abril, as autarquias tomaram em mãos dotar
as urbes de: água canalizada controlada analiticamente; de redes de esgotos dos
efluentes domésticos e de Estações para tratamento dessas águas e resíduos; da recolha dos lixos urbanos
e limpeza das ruas; no ajardinamento das áreas
exteriores de lazer; de colocação de Parques Infantis e de motricidade com
sparelhos de exercício físico para todos os que o desejem; de programas de
educação física etc., tudo contribuindo para um ambiente mais saudável, numa
melhor qualidade de vida, com consequências benéficas na manutenção de
comunidades saudáveis e na melhoria
dos indicadores da Saúde no novo Portugal de Abril.
A importância de valorizar as carreiras e os vencimentos dos profissionais de saúde, e do investimento em estruturas
de saúde pública.
Anos a fio de
degradação das carreiras e remunerações dos profissionais de Saúde, e de
carência de medidas para as tornarem atractivas e os fixarem no sector público
em exclusividade, agravou a situação de carência de profissionais no SNS, com
relevância nas especialidades de Saúde Pública, Medicina Geral e Familiar,
Obstetrícia, Saúde mental e muitas outras.
Faltam médicos e
outros profissionais de Saúde principalmente nos cuidados primários e hospitalares na Região Lisboa e Vale do Tejo, no Alentejo,
no Interior Centro e
Norte,
e no Algarve. Continuam por concretizar a construção há muito anunciada de
Centros de Saúde e de Hospitais como os Évora, Seixal, Sintra, etc., etc.; a
melhoria de instalações e
equipamentos noutros concelhos, a reabertura das unidades encerradas, e a promessa eleitoral sempre repetida e
sempre incumprida de todos os portugueses terem um médico e enfermeiro de
família.
Mantém-se a
intenção de encerar novas maternidades e de concentrar os serviços hospitalares
em grandes Unidades encerrando as restantes; afastando estes serviços vitais dos utentes, ampliando
o espaço desguarnecido e favorecendo a intervenção dos grupos privados de saúde, com todos os
custos materiais e de sofrimento para as populações.
O ministério passou a comportar-se como uma central
gestora do negócio da doença e deixou de ser um
promotor da saúde.
Um exemplo
flagrante desse facto, são as medidas transferindo verbas avultadas para o
sector privado da Saúde, afectando a estabilidade e a vida das grávidas como é
do encerramento definitivo ou intermitente de maternidades públicas no concelho
de Lisboa. Neste caso, consequência das medidas relativas à habitação e às
elevadas rendas de casa afastou do concelho para as periferias milhares de
casais jovens em idade fértil, logo as maternidades privadas ali construídas,
ficaram sem a quantidade mínima de utentes para manter a sua rentabilidade.
Então,
unilateralmente o ministério decidiu-se pelo enceramento de maternidades
públicas, primeiro nos concelhos da periferia – como foi o caso do Hospital de
Vila Franca de Xira, sem a administração ter sequer sido consultada acerca das
medidas relativas à maternidade, e às urgências de pediatria e obstetrícia – e
agora mesmo a do Hospital de Santa Maria aumentando os custos para o SNS, e o
sofrimento para as utentes e suas famílias.
Descentralizar
a Saúde para as autarquias locais e regionais ao invés de constituir um passo
no almejado processo de regionalização mais não será, do que abrir mais o
caminho para pôr em causa a universalidade deste direito e abrir mais o caminho
à entrega dos Cuidados Primários de Saúde ao sector privado, social ou não.
O MUSP não aceita esta medida nem
qualquer outra que não seja de valorizar o SNS e as suas Unidades de Saúde, criando
as condições para a medicina geral e familiar seja de proximidade, universal e
volte a ser gratuita para todos e em todo o País.
Criar órgãos
de gestão duplicados e afastados do poder central,
tem-se revelado uma forma de iludir os utentes e a solução dos problemas
As medidas
recentes, com a criação de diversas unidades locais de saúde, ou modificando a
estrutura do SNS não passam de mais um logro, não só resolvem os problemas de
fundo, como alimentam o caldo de cultura de ataque ao SNS. Ao invés
do caminho
seguido o que se impõe
é mais e melhor
investimento, medidas de fixação
dos profissionais de saúde em regime de exclusividade de funções, com melhores
carreiras e vencimentos, condições de trabalho e de investigação, medidas para
eliminar a transferência de verbas do erário público para o sector privado da
saúde, criar de facto os mecanismos de participação dos utentes na gestão do
SNS e não arremedos de falsa participação condicionando o associativismo
popular como está consignado na CRP.
Medidas de reforço e salvaguarda do
SNS
A nosso ver, será
importante:
– Valorizar
as carreiras e os vencimentos dos profissionais de saúde remunerando
adequadamente a dedicação exclusiva ao SNS;
– Investir
mais em estruturas de saúde pública, aumentando a oferta pública e melhorando
as condições de atendimento e de trabalho, e a reabertura dos Centros e
Extensões de Saúde encerrados;
–
Aumentar o número de vagas nos cursos de medicina;
– O Governo
use o poder da República para desbloquear a Certificação de centenas de médicos
estrangeiros ou nacionais formados no estrangeiro;
– Adoptar um
tempo mínimo de exercício profissional no SNS aos recém formados para assegurar
o retorno do investimento feito na sua formação, como sucede já noutras
profissões em Portugal, e na Saúde em países da UE;
– O Orçamento
de Estado para 2024 (OE24) deve contemplar verbas suficientes para o SNS recuperar e retomar as capacidades
no acompanhamento e tratamento a todos os níveis do nosso Povo.
– O OE24 deve
também contemplar medidas para reduzir ou mesmo eliminar a transferência de
verbas para o sector privado de Saúde;
– Criar uma
rede pública de Unidades de Cuidados Continuados e Paliativos acessíveis a
todos os utentes;
– Criar,
ampliar e dinamizar os Laboratórios públicos para produção de medicamentos e
investigação de novos fármacos adequados às patologias prevalentes e
emergentes, num trabalho integrado com as Unidades de Saúde Pública,
Hospitalares e de Cuidados Primários
de Saúde, assegurando a Soberania Nacional na produção de medicamentos;
–
Fornecer gratuitamente os medicamentos aos doentes crónicos
e aos pensionistas;
–
Acabar com as Taxas Moderadoras;
O MUSP, os Utentes e as suas
Organizações tudo farão para que estas medidas sejam adoptadas!
Populações com formação académica,
acesso à Cultura e informação, só por si não tem correspondência na aquisição
da consciência do problemas da Saúde e dos Serviços Públicos nem de uma
cidadania, critica, activa e participativa!
Este é um
problema estrutural e multidisciplinar da nossa sociedade afectando a cidadania
activa, o pensamento critico e, por tudo isso a Liberdade.
Um bom exemplo
está no facto de havendo no País mais de 1.700.000 Utentes sem médico de
família, cerca de 80% desses residem na área da ARS LVT, onde se encontram a
maioria dos quadros superiores e médios do País, onde há mais acesso à cultura,
à formação académica, à informação e à mobilidade para concretizar aqueles
outros acessos; apesar de tudo isso, no concelho de Lisboa, são escassas as Comissões de Utentes activas na Saúde –
actualmente com evolução muito positiva –, embora hajam outras organizações intervenientes
as quais o MUSP integra.
Também é na
capital onde os salários e nível de vida são mais elevados, o acesso aos
subsistemas de saúde é mais facilitado; mas também onde as seguradoras fizeram
o seu trabalho, aproveitando o desinvestimento do Estado nos cuidados primários
de Saúde, oferecendo cuidados ao domicílio e noutras modalidades servindo de
amortecedor àquela aquisição de consciência: muitos não têm médico de família e nem sabem disso até ao dia em a doença os
encontra e aqueles expedientes alternativos sucumbem e os desiludem não
satisfazendo as expectativas criadas.
O
alargamento da consciência social e cívica
é um desafio colocado ao MUSP e a
todos nós, para o qual teremos
colectivamente de encontrar as formas de contribuir.
Sem comentários:
Enviar um comentário