Ricardo Paes Mamede
11
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Não é preciso muita imaginação para perceber as razões do
protesto dos professores:
1. Precariedade dos professores contratados (são 20% do total de
docentes; podem demorar mais de 16 anos a conseguir aceder à carreira,
arriscando-se a saltar de escola em escola até lá; recebem em termos líquidos
cerca de mil euros por mês, tendo com frequência de suportar despesas
acrescidas de deslocação e estadia).
2. Deslocações dos professores efectivos em quadros de zona
pedagógica (não apenas os contratados, mas também muitos docentes de carreira
chegam a fazer deslocações diárias de 200 quilómetros).
3. Entraves à progressão na carreira (um professor com 50 anos
de idade e 25 anos de tempo de serviço em geral não foi além do 4º escalão,
levando para casa entre 1000 e 1400 euros; mesmo que tenham sido excelentes
professores em todos os anos lectivos, com grande probabilidade nunca chegarão
ao topo da carreira).
4. Sistema de avaliação (é pouco útil como instrumento de
melhoria de desempenho, não premeia os melhores e não permite afastar do sistema
aqueles que não deviam ser professores).
5. Perda de poder de compra (tal como os restantes funcionários
públicos, tiveram os salários nominais congelados praticamente todos os anos
desde 2000; por cima disto, só em 2022 perderam pelo menos 5% do seu poder de
compra).
6. Degradação das condições de trabalho (a perda real de
salários e o congelamento das carreiras dos professores aconteceram ao mesmo
tempo que aumentava o número de alunos por turma, aumentava a carga lectiva e
burocrática, deixavam de beneficiar de reduções de horário por motivos de
idade, aumentava a escolaridade obrigatória - e com ela os problemas sociais e
disciplinares com que as escolas têm de lidar - diminuía nas escolas o número
de auxiliares e de técnicos especializados - psicólogos, assistentes sociais,
etc.).
7. Perda de estatuto social (a acrescer à precariedade, à perda
de poder de compra e à degradação das condições de trabalho dos professores,
sucessivos governos não hesitaram em atacar a classe docente, tentando assim legitimar
os cortes orçamentais que impunham no sector; em 2019, numa manobra que
prenunciava o fim da Geringonça, António Costa ameaçou demitir-se caso o
Parlamento aprovasse qualquer reconhecimento do tempo de serviço que tinha sido
congelado, não resistindo à tentação de tratar os professores como
“privilegiados”).
Sete razões são suficientes para justificar o protesto dos
professores. A questão agora é saber i) se o governo está em condições de
perceber e dar resposta às razões do protesto, ii) se os sindicatos têm uma
atitude construtiva nas negociações (e.g., levando propostas suas para a
discussão) e iii) se os professores se deixam levar por quem está mais
interessado em fazer o protesto pelo protesto do que em fazer avançar as
condições de trabalho nas escolas. Há que ter esperança.
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