INTERVENÇÃO
(de Domingos David’ Pereira na Assembleia da Comunidade Intermunicipal
da Lezíria do Tejo)
Senhora Presidente,
Senhoras e senhores membros da Assembleia
da Comunidade Intermunicipal da Lezíria do Tejo:
Permitam-nos duas primeiras notas para
vos transmitir que os números que vou referir nesta intervenção são os últimos
disponíveis e que datam do fim de 2011, e que, das pesquisas que fizemos
verificámos que há uns meses atrás 278 serviços públicos tinham encerrado no
distrito de Santarém; como continuarem a encerrar serviços públicos, supomos
que neste momento já terão ultrapassado os 300, uma boa desses nos concelhos
aqui representados.
Lamentavelmente os organismos públicos não
disponibilizam os números actuais e, por isso, trabalhamos com base mais em
tendências e pela experiência de quem anda no terreno, falando com os utentes
de madrugada, nas filas de espera à porta das unidades de saúde, nas paragens
do autocarro, nas reuniões abertas ao público onde recolhemos testemunhos, por
vezes lancinantes, das suas situações e dificuldades.
Apesar disso, no que à saúde respeita,
podemos dizer que os utentes dos concelhos aqui representados no fim do ano
passado viviam realidades estatísticas diferentes.
Enquanto dos 116.571 utentes inscritos
nos seis concelhos a sul do Tejo, sob responsabilidade do ACES Lezíria II,
quase 27.000, cerca de 23%, não tinham médico de família, nos cinco concelhos
sob responsabilidade do ACES Ribatejo dos 137.957 utentes, cerca de 10.000, 7,18%, não tinham médico de
família.
Há, portanto uma clara diferença entre a
realidade dos concelhos a Norte e a Sul do Tejo, que deve merecer a atenção dos
eleitos, diligenciando no sentido de se eliminar a discriminação existente e
cumprindo com a Constituição da República Portuguesa repondo um Serviço
Nacional de Saúde de proximidade, qualidade, universal e geral e, tendo em conta as condições económicas e sociais
dos cidadãos, tendencialmente gratuito.
Mas mesmo nos concelhos a Norte do Tejo
os números não desvendam outras realidades pungentes, cuja existência se podem
entrever nos números divulgados pela ACSS, que, embora agregados no todo
nacional, nos permitem deduzir que uma parte da redução de centenas de milhares
de consultas nos cuidados primários será destes concelhos.
Tal como se passa no País, no distrito de
Santarém há populações que perderam a condição de utentes de um ou de vários
serviços públicos.
Perderam os transportes públicos, o
balcão da segurança social, a unidade de saúde, a farmácia local, o posto
público de correios onde recebiam a magra pensão e pagavam as contas, a
segurança pública, o acesso aos tribunais, o sinal de televisão, e podem perder
o último refúgio: a Junta de Freguesia.
Não conseguem medicar-se durante todo o mês
e alimentam-se mal. São populações isoladas, pobres, velhas, em profundo
sofrimento e solidão, condenadas à morte precoce.
E tudo isto utilizando o argumento de que
o SNS deve ser para aqueles que mais necessitam dele, como se essa questão da
equidade, da solidariedade e da justiça social não devesse ser resolvida em
sede fiscal como prevê a Constituição.
Mas a política seguida pelos últimos
governos prova que este caminho produz o efeito contrário. São os que mais
podem que veem garantido o acesso aos cuidados de saúde e aos escassos
benefícios existentes, porque são os que melhor se sabem defender. Vejam-se os
números dos apoios técnicos, como na comparticipação dos óculos e outras
próteses.
Quando se afastam os cuidados de saúde
primários dos utentes, fisicamente ou através do aumento desmedido das chamadas
taxas moderadoras, aqueles que ainda conseguem cuidar-se são os que ainda têm
meios para suportar esses custos, os que sabem ler, os que têm transporte
próprio ou um familiar com disponibilidade para o apoiar, os que têm acesso aos
novos meios electrónicos de comunicação; em suma: são de entre os utentes os
que mais meios materiais e intelectuais detêm aqueles que continuam com o
acesso garantido aos cuidados de saúde, e são os que menos têm e menos podem,
os que mais necessitam, que ficam arredados destes serviços.
Devido a este quadro devastador as taxas
de mortalidade, desemprego e de suicídio dispararam.
Nas híper-lojas compram-se frutos e
produtos hortícolas importados, num distrito que tem ao abandono alguns dos
mais ricos nacos de terra de aluvião do País, atribuindo-se subsídios para
deixar as terras incultas.
Por uma questão de princípio e de
humanidade, no Movimento dos Utentes lutamos para defender os Serviços Públicos
tal como estão consagrados na Constituição da República Portuguesa, o mesmo é
dizer que lutamos por defendê-la do vil ataque a que está submetida.
Muto obrigado por terem dado a palavra.
Tenho dito.
MUSP Santarém
Santarém, 12 de Setembro de 2012
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